Pela estrada circula vida, que vive, que morre e a que sobrevive.
É longo e também curto o caminho que todos percorrem; uns com mais e outros com menos velocidade. E, é tudo uma questão de tempo, que se vence a cada minuto; é, mais um dia de longa ou curta jornada, depende daquilo que se considera medida. E, o universo gira no ponto real e também no imaginário, é tudo uma questão de
filosofias e vida. A estrada pode ser caminho de asfalto, pedras e sobressalto, sempre vida; vida que não se encontra no espaço restrito; aquela masmorra com uma janela encardida pelo tempo não tem ar de ser vivida, e, é isto a vida!
Não se sente o rosmaninho a roçar no alcatrão; não se escuta a embreagem ao arranque, atropela-se o tempo; fazem umas quantas pontes áreas para forrar a alma de nadas.
Vê-se a cidade enfumarada de um monóxido, que já nos é indiferente, e circula-se na facha da direita para não correr riscos; e, vive-se uma ilusão, não se entende, não é preciso entender, é urgente sobreviver!
Afogados nas ruas pelos candeeiros gastos pelo tempo lemos as novas pelos ladrilhos dos passeios do abismo, descalcificados e emprenhados de buracos; não é época de salto fino, nem batom vermelho, a moda é outra. O buraco está lá e vê-se que abarca muitos e grosso salto é preciso contornar a curva, fazer moda; dar cor à palidez da cidade; um batom rosa não lhe ficava mal nos lábios sedentos e incolores.
Não que seja de filosofias, mas um homem não vive só de estrada; o mar leva-nos a outras estradas; há o céu que nos cristaliza a alma e aquece o coração, aos que ainda por cá estão; não quero pensar na outra, é para ser vivida a seu tempo!
E, vou ao presente deste meu encontro, uma passagem. Tenho muitas horas, o dia ainda agora clareou, acordo no despertar do Sol que me ilumina a alma e tudo o mais são acessórios que quero distantes. Não tenho pressa, mas gostava de perceber o dia, não que o não entenda, mas acordei com vontade de o degustar.
Pego num trapo, lavo o rosto e refino a barba num sabão que condiz com a pastelaria do bairro. Simpática a sua gente, um beteco de esquina que tem coração a mar. Não preciso de cinco estrelas, basta-me uma ‘barca’ qualquer para saborear o café, sim, o que me faz começar o novo dia. Não um café qualquer tem que ser de qualidade; aqui é especiaria demorada, emprenha o coração, há sempre alguém novo para trocar um olhar, até falar, é preciso; e sorrir, como me faz bem!
Sou um homem feliz, vivo no campo, longe da cidade; a estrada é de trigo e joio, trabalheira que compensa! Tenho medo da escuridão, arregaço as mangas e estendo a mão ao trabalho, gosto de ensinar os meus bois a conduzir! Nem ligo ao barulho frenético que envolve a cidade, a minha vida é aparte, tenho a minha natureza, mas vivo. Passeio pelo dia, conduzo as horas sem pressas e chego sempre tarde a casa.
Que horas seria, tarde, o sol descaiu, a cidade estava fria, algo era que não se via!?
Além, avistava-se uma menina, pobre farrusca, será que já tinha visto a cor do dia!? Aproximei-me, e o banco do jardim levantou num sereno desconsolo, não via pão e sentia o bolor dos dias.
O sorriso que eu tinha dava para dividir com ela e levava-a comigo no coração, que mais poderia fazer!?
Pensando bem, a pastelaria ainda estava aberta e na hora deveria estar a sair as primeiras fornadas. Voltei atrás, uma fala de estranhos e um chocolate quente, o que o estômago barrado pelo pão, acabado de fazer, tanto queria.
Não me custou nada, ainda recebi um sorriso que nem esperava! Afinal ela sabia a cor do dia, estava esquecida!
Volto para casa de mãos vazias e cheio de sonhos, projetos, arquétipos que não me levam a lugar nenhum, tenho esta mania de viajar.
Viajo pelas cortinas do quarto, adormeço na brandura da minha noite e sonho, aquele dia que irei acordar, não numa esquina qualquer!
Vivo, o que é meu e não só, à minha maneira, vivo!
É hora de acordar, tenho que despertar!
Hoje é domingo, não há pastelaria; há uma igreja numa cidade qualquer, pouco importa a localidade, nós nunca somos de lugar nenhum!
Não me canso dos quilómetros de estrada, vou até à beira mar, tenho fé!
A praia estava deserta, o que fizeram às gentes!?
Hoje não foi bom dia, devia ser a falta do café, domingo, a pastelaria estava fechada!
Elevei o olhar, o que vi, tanto azul!?
Perdi-me nas horas, e era noite, a praia continuava deserta e tinha frio; caía-me bem um chocolate quente, para não falar do pão a estalar da pastelaria; estava longe, longe do meu campo, numa cidade qualquer, perdi-me no tempo, que fazer!?
Não sou homem de grandes ideias, descansei na areia forrando o estômago de maresia dum ano qualquer. E, adormeci no tempo, não um tempo qualquer, o da minha cidade, aquela lá no campo.
Sonhei com a pastelaria e acordo pelo cheiro das bolas de berlim, gordas e açucaradas, que me passam ao lado!
Quem sou eu, não me conheço!?
Preciso d’um café, estendo a mão nas águas do mar e lavo a cara esfarelada pela areia; e, no mesmo trapo subo as escadas da vila; uma pequena aldeia plantada à beira-mar.
Encontrei-me num beco, janelas amareladas e um letreiro de papelão, com uns dizeres que não trazia no bolso. Continuei o caminho, não por muito tempo! Voltei atrás e bati à porta, oferecendo as duas mãos calejadas e pedindo o quarto em troca.
Valeu a pena, ainda há dias de sorte!
E, o dia se aqueceu numa caneca de leite com chocolate que aquela mulher, da ‘aldeia’, me preparou.
Poucas palavras, muitos gestos, tinha vida, tudo o que precisava, não que eu não tivesse vida, já tinha esquecido!
Sou um homem feliz, vivo no campo, longe da cidade; a estrada é de trigo e joio, trabalheira que compensa! Tenho medo da escuridão, arregaço as mangas e estendo a mão ao trabalho, gosto de ensinar os meus bois a conduzir! Nem ligo ao barulho frenético que envolve a cidade, a minha vida é aparte, tenho a minha natureza, mas vivo. Passeio pelo dia, conduzo as horas sem pressas e chego sempre tarde a casa.